terça-feira, 19 de abril de 2011

O FIM DO LIVRO - não contem com ele

Ensaísta e escritor italiano Umberto Eco - semiólogo, ensaista e escritor italiano (78 anos) - fala em entrevista exclusiva de seu novo trabalho, 'Não Contem com o Fim do Livro'

A conclusão é óbvia: tal qual a roda, o livro é uma invenção consolidada, a ponto de as revoluções tecnológicas, anunciadas ou temidas, não terem como detê-lo.

O desaparecimento do livro é uma obsessão de jornalistas, que me perguntam isso há 15 anos. Mesmo eu tendo escrito um artigo sobre o tema, continua o questionamento. O livro, para mim, é como uma colher, um machado, uma tesoura, esse tipo de objeto que, uma vez inventado, não muda jamais. Continua o mesmo e é difícil de ser substituído. O livro ainda é o meio mais fácil de transportar informação. Os eletrônicos chegaram, mas percebemos que sua vida útil não passa de dez anos. Afinal, ciência significa fazer novas experiências. Assim, quem poderia afirmar, anos atrás, que não teríamos hoje computadores capazes de ler os antigos disquetes? E que, ao contrário, temos livros que sobrevivem há mais de cinco séculos? Conversei recentemente com o diretor da Biblioteca Nacional de Paris, que me disse ter escaneado praticamente todo o seu acervo, mas manteve o original em papel, como medida de segurança.

A diferença básica é que uma biblioteca é como a memória humana, cuja função não é apenas a de conservar, mas também a de filtrar - muito embora Jorge Luis Borges, em seu livro Ficções, tenha criado um personagem, Funes, cuja capacidade de memória era infinita. Já a internet é como esse personagem do escritor argentino, incapaz de selecionar o que interessa - é possível encontrar lá tanto a Bíblia como Mein Kampf, de Hitler. Esse é o problema básico da internet: depende da capacidade de quem a consulta. Sou capaz de distinguir os sites confiáveis de filosofia, mas não os de física. Imagine então um estudante fazendo uma pesquisa sobre a 2.ª Guerra Mundial: será ele capaz de escolher o site correto? É trágico, um problema para o futuro, pois não existe ainda uma ciência para resolver isso. Depende apenas da vivência pessoal. Esse será o problema crucial da educação nos próximos anos.

Não podemos prever até que ponto nosso cérebro terá capacidade para entender e absorver novas informações. Até porque uma evolução física também é necessária.

Conhecer o passado é importante para traçar o futuro.

Reorganizo minha biblioteca segundo meus critérios e somente eu, e não uma secretária, pode fazer isso...

Alguns trechos extraídos do artigo. Lei a reportagem na íntegra clique


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Entre os livros que discutem, justamente, o "fim do livro", o melhor, em português, até agora, tem sido Não contem com o fim do livro (Record, 2010), transcrevendo conversações entre Umberto Eco e Jean-Claude Carrière, que trabalhou com Luis Buñuel e Peter Brook. A presença do semiólogo e autor de O Nome da Rosa (1980) e O Pêndulo de Foucault (1988) se justifica, afinal, Eco tem sido um dos principais eruditos a discutir o fenômeno da internet desde o início. Já Carrière, embora homem de teatro e de cinema, tem uma bagagem literária invejável e, ao contrário do que poderia parecer, não defende a "civilização de imagens" preconizada por McLuhan. Fora que o título do volume, ainda que chame a atenção nas livrarias, não corresponde ao seu conteúdo com precisão. Contrariando, mais uma vez, as expectativas, não se trata de um libelo contra os novos "leitores eletrônicos", da Amazon e da Apple, nem mesmo de uma visão apocalíptica sobre a ascensão do Google, ou mesmo de um ataque à suposta "literatura" (ou ao suposto "jornalismo") praticado em blogsNão contem com o fim do livroà maneira de Borges, faz uma belíssima defesa da leitura, da cultura e da civilização, abordando o livro como objeto, mas também com conceito e como ferramenta humana, imperecível, na visão de Eco. Séculos ou até milênios de História desfilam nas conversas entre Carrière e o semiólogo, num nível que a própria discussão, avançadíssima, sobre os formatos eletrônicos para leitura, nos EUA, ainda não alcançou. É o velho continente – e, não, o novo – discutindo o que os suportes digitais significam para o Homem, no sentido mais amplo, e, não, para os jornalistas, escritores oupublishers. Talvez as elucubrações de Eco e Carrière não alterem em nada o curso da tecnologia, mas sua perspectiva é fundamental em termos humanísticos. Não contem com o fim do livro deve, portanto, ser lido tanto por quem ama os livros quanto por quem já se acostumou à ideia do desaparecimento do objeto físico "livro". 

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4 comentários:

Unknown disse...

O livro tem seu papel, não importa o material

Aline Negosseki disse...

Nada se compara a um livro de papel, que podemos abraçar, beijar, cheirar e estimar!

Adorei o artigo, obrigada Inajá, porque sempre posta coisas tão pertinentes. Fiquei doida por ler o livro... Quem sabe acho-o na biblioteca :D

bjs

Inajá Martins de Almeida disse...

Elvio leitor amado de todas as horas e momentos.
Nós sabemos o quanto amamos nossas leituras. O quanto nos encontramos no branco das folhas e no negro das linhas.
Para nós cada livro nos descortina um horizonte inigualável.
Ainda que haja transformação no material utilizado para compor o livro, este em papel sempre terá seu espaço.

Inajá Martins de Almeida disse...

Aline querida
Sim nada pode ser equipado ao cheiro do papel, a cor da capa, ao formato das letras, ao conteúdo, aos espaços em que podemos deixar nossas impressões registradas, quando grifamos trechos, fazemos comentamos para posteriormente retornar justamente nas chamadas.
Querem acabar com o livro, mas ele está cada vez mais presente em nossas vidas, em nossos lares.
Um beijo e obrigada pela presença.

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